15 de Dezembro: a terceira vez em que pensei que ia perder a Carminho

Era uma sexta-feira. Aproveitei que estavam as duas a dormir a sesta para limpar a casa. Como elas tinham obrigatoriamente que comer de 3/3h eu punha o despertador para nunca me esquecer da próxima mamada. Tinha posto o despertador para a próxima vez que teria que dar o leite à Carminho e como geralmente a sesta delas era longa deixei-me estar descontraída a pôr a casa em ordem. Tocou o despertador e fui preparar o biberão. De seguida fui acordar a Carminho. 

Quando cheguei à beira do berço para acordar a Carminho vi que ela estava pálida, branca como a neve. Comecei a fazer-lhe festinhas na cara na tentativa de a acordar e mal lhe toquei a primeira vez senti que estava gelada. De repente deixei de raciocinar e comecei a abana-la freneticamente enquanto chamava bem alto por ela. Não respondia aos estímulos, não abria os olhos, não se mexia. Pensei que o pior tinha acontecido, pensei mesmo que a minha filha tinha morrido e desatei a chorar. Peguei nela ao colo e embrulhei-a numa cobertor quente. Continuei a tentar acorda-la já em pânico. De repente ouvi um gemido muito leve, tão tênue que pensei que o tinha imaginado. Mas não! Ela repetiu. Peguei no telefone e liguei ao 112. Aquelas perguntas todas que a pessoa que estava do outro lado da linha me estava a fazer eram uma autêntica perda de tempo naquele momento. Quando estamos aflitos queremos ajuda e não um bombardeamento de perguntas. Eu precisava de ajuda urgente! Lá me disse que ia enviar ajuda ao local. Tentei dar o biberão mas não reagia. Senti que a estava a perder a cada segundo que passava. 

Poucos minutos depois chegou a ambulância da Cruz Vermelha. Fiquei indignada quando os vi sozinhos sem a VMER. A minha filha não ia aguentar até ao hospital sem ajuda. Entrei para a ambulância e um dos tripulantes disse-me que a VMER estava a caminho. Fiquei mais sossegada. Arrancamos e uns metros mais à frente ouvi a sirene da VMER. Paramos na berma da estrada e estivemos 1h parados com o médico e o enfermeiro a fazer tudo pela Carminho. Picaram várias vezes e ela nem reagia. Ao fim de cerca de 1h arrancamos com os dois na ambulância à beira da Carminho. Eu tinha passado para o banco da frente mas os meus olhos continuavam focados naquela bebe tão pequenina que estava novamente a ser posta à prova. 

Chegamos ao hospital e ouvi o médico a dizer: via verde, sala de reanimação. E nesse momento entrei em choque. Até ali sempre tive noção de que era grave mas no meio de tanta azáfama ainda não tinha conseguido pensar e só naquele momento é que pus os pés bem assentes na terra. Ouvir “sala de reanimação”, atravessar o corredor da urgência apinhado de pessoas com os olhos postos na maca que acabava de entrar, ver a minha bebe perdida naquela maca tão grande a ser levada sem mim para aquela sala fez-me desabar. Nunca imaginei viver aquele pesadelo, nem que um dia aquele filme pudesse ser o meu. 

À entrada da sala de reanimação já nos esperavam rostos que me eram bastante conhecidos, as enfermeiras da urgência pediátrica e um médico da neonatologia. Entraram todos a acompanhar a Carminho com o médico e o enfermeiro da VMER. Entretanto foram entrando e saindo mais elementos da equipa da urgência. Eu fiquei mesmo à porta acompanhada pela tripulante da ambulância que foi incansável comigo, já não tinha mais o que me fazer para me consolar. 

Passado algum tempo saíram os dois elementos da VMER e também ficaram algum tempo comigo a tentar confortar-me. Agradeci-lhes por terem salvo a vida da Carminho. Não tenho dúvidas de que esteve na corda bamba dentro daquela ambulância e que eles foram os elementos chave para que ela tivesse entrado com vida no hospital.
Bastante tempo depois levaram-na a fazer um  RX e no final a enfermeira disse-me que a Carminho já está estabilizada e que ia subir para o internamento. Questionei se ia para a neonatologia ou para a pediatria e disse-me que ia para a pediatria visto já ter dois meses por idade corrigida mas que realmente fazia sentido ir para a neonatologia visto ser tão pequena, nem 2kg pesava, e tendo em conta que umas duas semanas antes foi internada na neonatologia quando se engasgou. Falou com a médica mas esta disse prontamente que ia para a pediatria porque já não tinha idade para a neonatologia. 

Pensei que o pior já tinha passado mas o pior ainda estava para vir.



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