Neonatologia | Evolução e sequelas da prematuridade

Quando as minhas filhas nasceram e as vi pela primeira vez tive uma necessidade urgente de saber como seria a evolução delas a partir dali. Precisava de ver respondidas perguntas simples: qual o ganho de peso (norma) diário? Quais as sequelas que poderão ficar para a vida? Quanto tempo em média vão ficar internadas? Qual o risco de as podermos perder? Irão ficar com um aspecto normal? (O aspecto de um bebé prematuro é muito diferente do aspecto de um bebé normal como expliquei no post “O Impacto de as ver pela primeira vez”).

Como seria de esperar os médicos não nos dão estas respostas. Em medicina as coisas não são lineares, a evolução é muito diferente de bebé para bebé e as pedras que poderiam surgir pelo caminho não podiam ser expectáveis. Daí a resposta ser sempre: cada minuto conta. É um dia de cada vez.

Na minha insatisfação face a não obter as respostas que desejava procurava exaustivamente no Google testemunhos de pais que tivessem vivido esta realidade. As palavras chave eram “prematuros de baixo peso”, “evolução de bebés prematuros”, “sequelas em bebés prematuros”, “tempo de internamento de um bebé com 400gr”,... 
As respostas eram vagas. Muitas delas vindas de meios de comunicação social que davam notícias de um bebé que sobreviveu com 400gr e esteve X tempo internado. Mas o que eu queria e precisava de ler eram relatos de pais que viveram na primeira pessoa aquela experiência. Nas paredes da neonatologia encontrávamos várias fotografias de bebés que nasceram lá, em que tinha a fotografia do bebé e o peso à nascença e ao lado uma fotografia do mesmo bebé com cerca de 12 meses e o peso nessa altura. Era terapêutico para nós ver essas fotografias porque percebíamos que a partir de uma dada altura conseguem recuperar o peso para a idade, conseguem ter feições “normais” e nem se percebe que eram bebés prematuros. Continuávamos era sem ter relatos de sequelas, de doenças crônicas.

Como já referi, a evolução de um bebé prematuro não é linear, não há uma evolução padrão mas sinto necessidade de escrever sobre a evolução das minhas filhas porque sei que tal como eu há mais pais a precisar de relatos destes. 

A Carlota nasceu com 1125gr. Na primeira semana perdeu peso e chegou aos 980gr. A partir daí o ganho de peso era de cerca de 30/40gr/dia. Só necessitou de ventilação mecânica nos dois primeiros dias de vida. A partir daí ficou apenas com oxigénio que manteve até às 7 semanas. Começou a ingerir o meu leite, 1ml de 6/6h, por sonda ao fim de dois dias e sempre tolerou muito bem, foi aumentando gradualmente. Nunca teve nenhuma infecção durante todo o internamento e ao fim de duas semanas e meia saiu dos intensivos e passou para os intermédios (apanhei um susto de morte quando cheguei à incubadora e a vi vazia! Veio a enfermeira a correr aflita explicar-me que tinha ido para os intermédios). Começou a beber leite pelo biberão e a mamar na mama ao fim de 4 semanas mas para não se cansar muito (perdem peso e baixam as saturações de oxigénio quando mamam) fazia metade por biberão ou mama e outra metade por sonda. Saiu da incubadora quando faltava uma semana para fazer dois meses. Teve sempre um progresso surpreendente e teve alta ao fim de dois meses quando já mamava perfeitamente bem por mama ou biberão e atingiu os 1750gr (é o peso mínimo com que geralmente dão alta).


A Carminho encontrou mais percalços no caminho mas dentro da sua restrição grave de crescimento também teve uma evolução muito boa. Nasceu com 475gr e na primeira semana baixou até aos 402gr. Necessitou de ventilação mecânica durante 5 dias, a partir daí ficou com ventilação não invasiva durante duas semanas e depois com oxigénio até aos três meses. O ganho de peso dela oscilava entre os 30/50gr/dia mas necessitava de um fortificante de leite materno para a fazer engordar mais rapidamente. Num dia em que não lhe dessem o fortificante o peso estagnava. Começou a ingerir leite materno por sonda ao fim de 5 dias, 0,5ml de 6/6h, e não tolerava por isso teve que parar e só reiniciar uns dias depois. O aumento foi muito lento porque não digeria o leite embora a quantidade fosse muito baixa. Só começou a beber pelo biberão com cerca de dois meses e em pouca quantidade. Fez várias transfusões de sangue por anemia, que mantém. Uma semana depois de nascer verificou-se que tinha um problema ósseo, osteopenia, que consiste em ter os ossos mais frágeis com maior risco de fractura. E no mesmo dia verificou-se que tinha também um problema no fígado, colestase metabólica. Iniciou uma série de medicação para estabilizar ambos. Ainda permanecem mas estão ambos controlados. Tem também uma doença cardíaca crônica (comunicação inter auricular) e uma doença pulmonar crônica (displasia broncopulmonar). Ambas muito bem vigiadas. Teve uma infeção gravíssima ao fim de 14 dias, uma septicemia. Passou dos intensivos para os intermédios ao fim de quase dois meses e dois dias depois foi transferida para Viana do Castelo. Saiu da incubadora ao fim de três meses e teve alta ao fim de três meses e meio com 1700gr. As ecografias cerebrais eram as que mais me assustavam mas contra todas as expectativas não ficou com qualquer sequela a nível cerebral. Tem estigmatismo e por isso usa óculos (ou eu tente que os use porque ela passa a vida a tirar).  


Apesar de tudo sou grata porque a Carlota tem apenas otite serosa, que lhe provoca em média uma otite por mês, e a Carminho apesar das suas doenças crónicas é muito bem acompanhada e estão controladas. 

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