Gravidez | Tive que ser internada

Apesar do parto só estar previsto para Outubro estava a aproximar-se o mês de Agosto e com ele uma agenda muito preenchida para todas as pessoas, no mês de Setembro a minha disposição para festas já não devia ser muita, dado o tamanho que previa que a barriga fosse atingir, por isso o babyshower das princesas foi feito no final de Julho. Uma festa linda preparada por uma amiga muito prendada e dedicada em que estivemos rodeadas pelas pessoas mais importantes para nós. Como as coisas estavam, finalmente, a correr bem aproveitei a festa sem qualquer preocupação. 


A meio dessa semana tinha uma consulta de rotina com o médico que me estava a seguir. Ele ia de férias no final dessa semana e antes queria avaliar as duas pequenas para se certificar que estava tudo bem e deixar as coisas encaminhadas para os quinze dias que iria estar ausente. 

De manhã cedo fui então à consulta, desta vez numa quarta-feira, e fez a ecografia. No final quando já estávamos sentados à secretária disse-me com ar apreensivo: Vera, isto está tudo a descambar! E naqueles segundos seguintes em que nenhum dos dois disse nada passou-me um milhão de coisas pela cabeça. Síndrome de transfusão feto fetal novamente? Eu não vou suportar fazer aquele tratamento novamente. A Carminho não está bem? Alguma coisa que ainda não tenha acontecido? E a medo lá perguntei: o que se passa agora? A resposta era a que eu não queria efectivamente ouvir. A Carminho estava com alteração no fluxo de sangue e estava novamente em risco e eu ia ter que ser internada para uma vigilância diária e para fazer corticoterapia para maturar os pulmões das meninas porque a qualquer momento podiam ter que fazer o parto. Naquele momento petrifiquei. Estava grávida de 28 semanas. Ficar internada? Podem ter que nascer tão prematuras? E a Constança vai ficar sem mim? 

Voltei a perguntar a medo: 

- Durante quanto tempo? 

- À partida até ao final da gravidez. 

Desatei a chorar. Até ao final da gravidez? Faltam mais de dois meses! Eu não posso ficar longe da minha filha durante tanto tempo! A Constança tinha 16 meses.

O médico disse que podia ir a casa organizar as minhas coisas, preparar tudo e no dia seguinte ia ter com ele ao hospital para me internar. Sai da consulta e atravessei o hospital a chorar desalmadamente. Eu não ia aguentar tanto tempo longe da minha filha. Eu sabia e percebia que era para o bem das irmãs mas a Constança precisava tanto de mim e eu dela! 

Liguei a uma amiga e fui ter com ela, precisava de falar e pôr as ideias no lugar. De seguida fui para casa fazer as malas. Não tinha nada preparado, era demasiado cedo para pensar nisso, e não tinha metade dos bens da lista que pediam para mim. Apenas tinha lavado as primeiras roupas das gémeas e consegui fazer a mala delas. Estava tão bloqueada que o meu cérebro nem atingiu que elas não iam precisar de roupa se nascessem naquele momento. Iriam para a neonatologia e a única “roupa” que iam usar era uma fralda descartável e um lençol para as cobrir. Separei alguns pijamas meus e coloquei também na mala. A minha mãe depois ia tratar de me arranjar o que faltava na lista. Eu estava preocupada com as camisas de abrir à frente, como se eu fosse amamentar as minhas filhas naquele momento! Fui buscar a Constança à creche e colei-me a ela. Aproveitei cada segundo até ela adormecer. E só chorava por pensar que tão cedo não ia ter aqueles momentos com a minha filha. Um sentimento de culpa horrível. Ela não escolheu ter irmãs tão cedo e eu não tinha o direito de a privar da mãe. Que irresponsabilidade a minha! 

No dia seguinte fomos levá-la à creche e com o coração despedaçado dirigíamo-nos ao hospital. Não conseguia acreditar que aquilo me estava a acontecer. Quando cheguei ainda perguntei ao médico se não podia ir para casa e dirigir-me todos os dias ao hospital para fazer uma ecografia e fazer assim a vigilância. Não! Era mesmo necessário ficar internada. Fiz logo a primeira dose de corticóide e fui para a enfermaria. Tinha uma companheira de quarto, muito simpática por sinal, mas a minha disposição era péssima. Sinceramente ela ajudou-me muito naquele dia porque enquanto falava comigo eu não tinha tanto tempo para pensar. Era brasileira e o sotaque e as expressões que usava ainda me arrancaram uns sorrisos. Mas só durante o dia. Quando escureceu comecei a pensar na rotina toda que estaria a ter naquele momento em casa com a Constança e abri novamente a torneira. Não consegui jantar quase nada. Só chorava.  Pensava na hipótese das minhas filhas terem que nascer tão cedo e nos riscos que isso acarretava. Pensava na Carminho que depois de tantas superações não merecia passar por mais esta. E assim foi pela madrugada dentro. Nem consigo descrever o que senti naquela noite. Era uma tristeza tão mas tão grande, um sentimento de impotência, um vazio. Devo ter adormecido já depois das 4h. 

No dia seguinte acordei, tomei banho e depois de tomar o pequeno-almoço deitei-me novamente. Comecei a ter uma sensação estranha. A barriga ia-se contraindo. Como o parto da Constança foi induzido com ocitocina não cheguei a ter as primeiras contrações menos dolorosas, mais curtas e mais espaçadas. Comecei logo com contrações fortes, dolorosas é pouco espaçadas. Por isso não sabia muito bem se aquilo que estava a ter eram contrações. Chamei a enfermeira e disse-lhe que achava que estava com contrações. Esta alertou o médico e comecei a fazer CTG. Quando viu o traçado verificou que estava em trabalho de parto. Oh meu Deus! Como é possível? 

Fui encaminhada ao gabinete médico e avaliada. O médico não era de muitas palavras e não se alongou muito em explicações. Ia começar a fazer medicação para parar o trabalho de parto e iam tratar da minha transferência. Telefonei ao meu marido para ir para o hospital o quanto antes. 

Pouco tempo depois de ter iniciado a medicação as contrações pararam. O médico veio à enfermaria dizer que estava tudo tratado, eu ia para Coimbra. Coimbra?! Tão longe? Tinha sido o sítio mais perto onde arranjou uma vaga. Pedi-lhe que tentasse uma vaga mais perto por causa da Constança e a resposta dele apesar de assertiva magoou-me muito: - a sua filha que está em casa está bem, pense só nestas que neste momento não estão nada bem.  Eu sei que era mesmo assim que devia pensar mas não conseguia. Era demasiado duro estar tão longe da minha filha. Pedi que a fossem buscar para estar um pouco com ela e levaram-na ao hospital. Estive com ela até à hora de ser transferida. Entretanto veio outro médico avaliar-me e dizer-me que conseguiu uma vaga no Porto. Que bom! Porto era bem mais perto. 

A ambulância chegou e era a hora de ir para um hospital que não conhecia mas que diziam ser excelente e estar nos melhores do país. O Centro Materno Infantil do Norte (CMIN) ia ser a primeira casa das minhas filhas. 

E lá fui eu em direção ao Porto. Ou não...

7 comentários :

  1. Mas que aventura! Nem imagino como é que essa cabeça e esse coração deviam estar nesse momento! ❤

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    1. Deve ter sido um dos piores dias da minha vida o dia em que fui internada. Tinha a cabeça num turbilhão entre o que era melhor para as gêmeas e o quanto me ia custar estar longe da Constança! 😘

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  2. Ho Deus! Chorei porque eu também chorei imenso quando me disseram que teria de ficar internada. Não queria, o que queria era ir para casa e abrasar minha filha muito forte e nunca mais a largar. Eu acho que fomos seguidas pelos mesmos médicos. Também fui seguida nas duas gravidez no hospital de Viana e a maneira como fala dos médicos ou melhor o que eles lhe dizem foi o que me diziam a mim....

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