Gravidez | Pensei que ia morrer com tanta dor (Londres parte II)

Na sala estavam as duas médicas que me tinham avaliado inicialmente e uma médica espanhola, que acabou por ser a tradutora. À minha frente estava um plasma enorme, outro um pouco mais pequeno e dois ainda mais pequenos. Atrás da marquesa a parede era toda vidrada com visibilidade total para uma sala um pouco mais pequena do que a sala onde se ia realizar o tratamento. O meu marido tinha pedido para não assistir porque não se sente confortável e podia acabar por desmaiar mas a médica não lhe deu outra hipótese, tinha mesmo que entrar. Ficou atrás de mim encostado à marquesa e disse-me que tinham acabado de entrar cerca de 20 médicos para a tal sala vidrada. Não me surpreendeu porque o médico do Hospital de Braga já me tinha alertado que estavam sempre muitos médicos a assistir. 

A médica espanhola explicou-nos que 80% dos médicos que trabalham nessa clínica são médicos de vários países que vão para lá, durante cerca de três meses, para aprenderem estes e outros procedimentos com o Professor Nicolaides, o médico que viria realizar o tratamento, porque  é o crânio da obstetrícia e a maior parte dos exames de diagnóstico pré natal foram descobertos por ele. Eu vim a constatar isso em Portugal, todos os médicos que encontrei depois do tratamento conheciam de alguma forma o Professor Nicolaides. 

Notei que o médico era uma pessoa que de certa forma os deixava intimidados porque estava um nervoso miudinho no ar e à medida que se aproximava a hora da sua chegada as médicas que estavam comigo na sala foram ficando um pouco stressadas. A porta abriu-se e só faltou fazerem-lhe uma vénia. Era um senhor que aparentava ter uns 50 anos, cabelo grisalho e despenteado, a tresandar a tabaco e vestido com fato e gravata. Cumprimentou-nos, apresentou-se e tirou apenas o casaco, mais uma vez não havia batas. Olhava para ele e fazia-me lembrar o Dr. House, pelo estilo descontraído e brincalhão mas algo sarcástico. 

Começou por repetir a ecografia para ver em que local ia introduzir o fetoscópio. Perguntou a uma das médicas onde deveria introduzir e ela a medo respondeu, e levou uma repreenda. Perguntou à outra e repetiu-se a história. Elas tentaram argumentar mas ele nem lhes deu hipótese. Entrou um carrinho com o material. Ele calçou as luvas, pegou na seringa com a anestesia e administrou no local. Nem um minuto depois estava a fazer um corte com um bisturi e eu a contorcer-me com dor. Depois do corte pegou no bisturi na vertical e espetou (literalmente), fez movimentos rotativos para ir abrindo o orifício. E eu gritava e chorava com dor. Pedi que esperasse um pouco porque não estava a suportar mas ele mandou-me respirar fundo e voltou a espetar mais para baixo e a fazer novamente movimentos rotativos. Queria pensar que era para o bem dos meus bebés mas a dor era imensa e não me permitia pensar em nada a não ser naquele momento horrível. Pensei que ia morrer de dor. Se o meu marido não tivesse presenciado tudo eu ia achar que tinha delirado e que aquilo não aconteceu. Nunca sofri tanto em toda a minha vida. 

Introduziu o fetoscópio e ligou a câmara. No ecrã gigante que estava à minha frente estavam os meus bebes. A câmara estava em frente deles e a imagem era tão nítida e real. Vi-lhes o cabelo, a cara, as mãos. As feições todas. Eram lindos! Perguntou se queríamos saber o sexo. Não quisemos. Naquele momento não sabíamos se iriam sobrevier e não queria criar mais expectativas. Optamos por desistir de confirmar o sexo, por não escolher os nomes nem comprar nada. Já chegava ficar com os seus rostos gravados na memória. 

Geralmente o procedimento demora cerca de 30 minutos, o meu durou cerca de 1h15.  O fetoscópio andava de um lado para o outro  e o médico suspirava e dizia que estava muito complicado para encontrar o local onde devia encerrar as ligações vasculares. E assim foi durante cerca de 25/30 minutos. Foi sempre brincando para nos deixar mais descontraídos mas eu continuava com dor e não conseguia descontrair. 



Carregou então no laser e no ecrã viu-se uma espécie de fogo a sair e ao mesmo tempo a expressão e os movimentos dos meus bebes era como se estivessem a ser electrocutados. Preferi não saber se aquilo lhes causava dor mas acho que sabia a resposta mesmo sem perguntar. Utilizou o laser umas cinco vezes e a expressão foi sempre a mesma. Ao fim desse tempo verificou através da câmara que já tinha terminado e que estava resolvido. 

- E os bebés estão bem? - Daqui a uma hora avaliamos. Mas antes disso vamos colher sangue a ambos para análise. 

E foi colhida uma seringa de sangue a cada um. Disse-me que ia beber um copo e que voltava 1h depois para reavaliar.

Eu sentia-me fraca e com muita dor. Em Portugal aquele corte dava direito a dois ou três pontos mas lá foi-me colocada uma compressa dobrada ao meio e adesivo castanho a fazer uma cruz em cima. Nem compressão fazia para parar a hemorragia (fiz eu com a mão durante 1h). Pensei que se fizéssemos um penso daqueles em Portugal os nossos colegas até se riam de nós. E disseram que me podia levantar e ir para a sala onde esperei anteriormente. Não sabia bem como ia conseguir levantar-me mas o meu marido ajudou-me e a muito custo lá fui. Tensões arteriais também não se avaliam! Estava pálida e sentia que ia desmaiar. Deitei-me no sofá e deixei-me estar quietinha. A pontualidade britânica não falhou e 1h depois fui chamada novamente. Mas afinal não foi só para reavaliar.

1 comentário :

  1. Meu Deus!
    Mas que raio... e a anestesia????
    Li cada palavra e em todas elas senti uma parte dessa dor! 🙁

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