A nossa casa transformada num hospital

A Carminho teve alta mas continuava a requerer todos os cuidados que tinha no hospital e por isso no dia da alta nasceu uma enfermaria de hospital na nossa casa. 

Com ela veio um aspirador de secreções e as respectivas sondas de aspiração, um ventilador e máscaras suplentes, um oxímetro, uma bala de oxigénio das grandes e respectivos cateteres nasais, sondas nasogástricas e toda a farmácia dada a medicação que fazia. 

Passei a ser enfermeira da minha própria filha. E se até ali me doía a alma ao ouvi-la chorar quando lhe prestavam os cuidados enquanto olhava para mim numa tentativa de pedir ajuda, agora a dor era ainda mais forte porque aquela que devia ser o seu porto seguro, que a devia proteger e acarinhar (eu!) era precisamente a pessoa que a estava a fazer sofrer. Sabia que era o que tinha que ser feito e que era para o seu bem mas ficava de rastos.

Tinha que lhe dar o biberão e de seguida o restante leite (que era quase todo) por sonda, de 3/3h. Tinha que a entubar umas cinco vezes por dia porque ela arrancava a sonda mesmo com uma meia enfiada na mão. Tinha sempre que lhe aspirar as secreções antes de cada mamada. Fosse de noite ou de dia. Fazia medicação por câmara expansora de 8/8h. Tínhamos que pôr o despertador a tocar o tempo todo para que nada falhasse. 

Tudo isto lhe causava sofrimento e o choro dela era sufocante. Se a Constança estivesse em casa custava-me ainda mais porque gritavam as duas. Uma por lhe estar a custar e outra em aflição a pedir para parar, para deixar a menina ou como ela dizia “para! Deixa a Mim. Estás a fazer dói dói à Mim” (Mim era como ela chamava à Carminho). Depois dizia a toda a gente que a mamã fazia dói dói à Carminho e que ela chorava muito. E eu era a má da fita. 


Não podia tomar banho porque andava com a tala para correção da luxação da anca e não a podia tirar para nada. O banho era dado com compressas humedecidas e já ansiávamos pelo dia em que a íamos poder pôr numa banheira e dar-lhe um bom banho. Dia esse que só aconteceu quatro meses depois de pôr a tala. Ao longo desse tempo a tala foi ganhando cheiro por muito que a limpássemos. Não se podia sentar por causa da tala portanto íamos arranjando estratégias para a mudar de posição, para que não estivesse sempre deitada. Não lhe comseguiamos vestir calças nem meias calças, passou a andar sempre de cuieiros para ficar mais resguardara. O oxímetro alarmava o tempo todo, durante o dia não incomodava mas à noite era aborrecido e um de nós levantava-se sempre para ver os valores. O ventilador, bem o ventilador merece uma publicação só para ele porque foi o nosso verdadeiro pesadelo.

Apesar de tudo e do cansaço extremo, ainda tínhamos mais duas bebés totalmente dependentes de nós para todos os cuidados, não podíamos estar mais felizes e gratos, estávamos todos em casa e depois de tudo este era o cenário perfeito. 






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