A adaptação da Carminho ao ventilador

A  Carminho começou a usar o ventilador no dia em que teve alta da pediatria. O uso do ventilador era para os períodos em que ela dormisse, durante a noite e as sestas, os momentos em que as saturações de oxigénio baixavam. Incrivelmente no minuto em que lhe puseram o ventilador ela adormeceu e dormiu um bom sono como se dali saísse um ansiolitico qualquer (não sai!!). Fiquei abismada e pensei: ok, isto afinal vai ser muito mais fácil do que o que eu imaginei! Explicaram-me que geralmente era mesmo assim, ela iria relaxar de tal forma, já que não teria trabalho para respirar, que dormia um sono profundo.


Chegamos a casa e eu estava convencida de que as coisas fossem ser assim, no momento de a adormecer punha-lhe o ventilador e ela adormecia. Só que não! Foi um verdadeiro pesadelo. Mal via o ventilador começava aos gritos. Experimentamos colocar-lhe o ventilador antes de a adormecer para ver se ela adormecia e ela gritava até o tirarmos, fosse ao fim de dez minutos ou uma hora. Experimentamos adormecê-la primeiro e colocar o ventilador depois de já estar a dormir e ela acordava no momento exacto em que o colocávamos e gritava até que o tirássemos. Passamos uma semana praticamente sem dormir, no põe e tira o ventilador. Ela andava exausta mas não o aceitava e não dormia, dormitava no meu colo mas acordava aos gritos de cinco em cinco minutos. Eu acabava por ceder e a meio da noite acabava por deixá-la dormir sem ele ficando eu acordada a vigiar o sono dela.

Nessa altura as consultas de pneumologia eram semanais e a médica pedia sempre que insistisse mais, até que três semanas depois ela ainda não fazia a noite inteira com o ventilador. Nessa consulta saí de lá lavada em lágrimas. A médica, que é um amor de pessoa, foi extremamente dura comigo e disse-me com todas as letras que ou eu mudava o chip e a deixava gritar a noite toda com o ventilador até ela se habituar ou nunca mais conseguia. Porque se fosse um antibiótico em que fosse um caso de vida ou de morte eu também não ia facilitar. Só eu sabia o quanto me custava ver a minha filha aos gritos, depois de tudo o que já tinha sofrido e o que ainda sofria com entubações e aspirações de secreções constantes. Mas sabia que a médica tinha razão e que aquela postura que teve comigo foi o clique que eu precisava para ser mais rígida. Saí de lá e disse: na próxima semana não vou ouvir outro raspanete, na próxima semana vens à consulta a fazeres o ventilador a noite inteira. 


Passei cinco dias sem dormir uma hora durante a noite. Cinco dias com a Carminho no colo aos gritos e eu de coração partido a chorar com ela mas nem um minuto cedi. Passava a noite inteira com o ventilador, dormia 15 minutos e acordava aos gritos e assim sucessivamente até de manhã . Os tempos de sono foram aumentando progressivamente e ao fim de seis dias começou a dormir a noite completa com o ventilador no berço (apenas acordava para comer). Ao fim de uma semana e meia já não conseguia adormecer sem o ventilador, quando ficava com sono e começava a fazer uma birra de sono colocava-lhe o ventilador e ela adormecia. E assim começou uma relação de dependência, em que nem as sestas faz sem o colocarmos primeiro. 

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